segunda-feira, 17 de março de 2008

BRASIL URGENTE

A viúva
O escritor Elio Gaspari costuma referir-se ao Estado brasileiro como “viúva”. É uma maneira antiga de se brincar com aquilo que não tem dono, é mal cuidado, tal como se atribuía antigamente ao que era propriedade de uma viúva, que, naqueles tempos, não sabia administrar o que era seu. Hoje é muito diferente, tem muito patrimônio de viúva que até melhora. Mas o apelido que o escritor criou tem toda razão de ser. Afinal, existe coisa mais mal cuidada no Brasil do que o patrimônio público?Difícil de achar. Mesmo administrações corretas, preocupadas com a situação, se vêem às voltas com descaso de funcionários irresponsáveis, investimentos mal aproveitados, burocracia, etc. Vamos a alguns casos, históricos e recentes, que demonstram muito bem o que falamos. 1.O cidadão e a RepúblicaO Estado brasileiro tem tradição patrimonialista, ou seja, quem ocupa o cargo, entende que o que é público é seu. Não se obriga a dar satisfação a quem quer que seja. Quem trabalha na administração pública não se sente obrigado com o resultado do que faz (não é regra, mas ainda existe muito), não se sente comprometido com o que “não tem dono”, mas que na verdade tem sim, é de todo o povo. Se isso é grave, mais grave é o povo que não se entende “cidadão”. Não sabe de seus direitos, mal conhece seus deveres. E não se preocupa com isso. Destrói o que é publico sem se dar conta de que aquilo foi construído com o seu dinheiro. Suporta corruptos sem se dar conta de que ele também está sendo roubado por eles. Esse comportamento estimula a impunidade e faz avançar um gênero de político desprezível. Não é o que rouba, pois este já é caso de polícia, mas o que aceita tacitamente o roubo, aliando-se ao que rouba com o argumento de que “todos os lados tem que ser ouvidos”. Alguns argumentam com “uma postura aberta”. Tão aberta que se perde... 2.A PEC da transiçãoEsta Gazeta noticiou e os jornais mineiros também, a votação, em breve, de uma proposta de mudança constitucional do deputado Dalmo Ribeiro Silva, que institui regras de transição de governo. Quer exemplo mais acabado do que este da postura patrimonialista e irresponsável dos administradores públicos? Serem obrigados por lei a passarem a seus sucessores legalmente eleitos à situação das finanças públicas?Certamente a inspiração do Deputado foi a situação vergonhosa verificada em sua base eleitoral, mas é regra no estado todo. Tem Prefeito que leva até a chave embora. O sucessor tem que entrar através dos bons ofícios de um chaveiro. Ora, o que passa na cabeça de um Prefeito, prestes a abandonar o cargo, em sonegar informações, sobre o que é público, para seu sucessor? Que me perdoem aqueles que de repente resolveram ser “da paz”, mas só existe duas alternativas para isso: esconder o roubo ou atrapalhar o sucessor. Ou ambas, conjugadas, o que é mais normal. E igualmente o que dizer de inúmeras Câmaras de Vereadores que também sonegam as informações de como gastam o dinheiro público? O Senado está tentando abrir a caixa preta dos gastos com a chamada “verba indenizatória”, dinheiro para ressarcimento de gastos a que todo Senador e Deputado tem direito. Tem gente que gasta até nas férias. Apoiamos firmemente a iniciativa do deputado, mas rogamos a Deus para que chegue o momento em que os administradores públicos saiam de seus postos de cabeça erguida, mostrando às claras a situação da administração. Só por obrigação moral e ética, sem lei que os obrigue a não ser a lei natural de que , quem administra, tem que prestar contas do que faz ao dono, no caso o povo.
As portasA casa, com algumas raras exceções, tem duas portas, a da frente e a dos fundos. Convencionou-se chamar a da frente como de porta nobre, a dos fundos usa-se para coisas menos nobres, como tirar o lixo, por exemplo. Assim, a porta da frente traduz o que é valoroso e a dos fundos o que é imprestável, o que é feito às escondidas. Em diversas situações na nossa vida pode-se entrar e sair pela porta da frente ou pela dos fundos. Podemos conhecer um grande amor pela porta da frente, da maneira correta. Podemos sair desta mesma relação pela mesma porta, ou pela dos fundos, quando a mentira , a traição, etc, dão o tom. Assim é na política. Pode-se entrar por ambas as portas. Em tempo de alianças e preparação para as eleições, todos tem que fazer esta análise. Se sou um principiante, estou entrando pela porta da frente ou pela dos fundos? Como estou tratando minhas companhias? Aceito alianças com tudo que apareça, obedecendo ao meu sonho de poder ou estabeleço limites éticos e morais?Se já estou na política, devo refletir como sairei dela um dia. Pela porta da frente, sorrindo para a sociedade e enfrentando-a de peito aberto quanto a meus eventuais erros, ou pela porta dos fundos, fugindo às responsabilidades, negando os “buracos” deixados?Convenhamos que seja muito triste ver alguém sair pela porta do fundo napolítica. Pior ainda é ver alguém entrar nela por esta mesma porta.

Eduardo Bortoloto Filho

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